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- "Não estou dizendo que deva perdoá-la. Nem sequer digo que tem que ver ela. Mas... vamos nos casar, Rach. E é sua mãe. Acho que deveria saber." – disse Finn pela centésima vez na tarde, enquanto terminava de encher as planilhas com estatísticas.

- "Não soube nada dela em... doze, treze anos. O que se supõe que deva fazer, Finn? Bater na porta dela e dizer: 'Oi mamãe, vou me casar em uns meses e gostaria que estivesse lá?'" – respondeu Rachel, enquanto dobrava a roupa que havia tirado da secadora.

Ele tirou os óculos e esfregou as pálpebras com um gesto cansado.

- "não vou discutir mais isso. Só queria sugerir, mas claramente não aceita sugestões." – lhe disse, um pouco ofendido, juntando seus papeis e abandonando o quarto.

Rachel suspirou. Havia sido assim há dois dias, quando Kurt havia perguntado se já tinham definido os convidados e Finn havia recordado da existência de Shelby. Não era que Rachel não a recordasse, mas que sua mãe não parecia se recordar dela. Não, anos atrás havia lhe dito claramente que não a necessitava, que queria uma família nova e Rachel havia obedecido, havia se mantido afastada e nas sombras, sem sequer se atrever a buscá-la. Não queria discutir isso. Não queria que Finn sentisse que não o escutava e muito menos que aquele tema fosse um tópico difícil em sua relação.

- "Posso entrar?" – lhe perguntou, aparecendo na porta do estúdio e trazendo um sanduíche em sinônimo de paz.

- "Sim... sente-se." – ele pediu, apontando para o espaço vazio que havia ao seu lado no sofá.

- "Realmente quero que entenda que não a necessito em nosso casamento, Finn. Que vou ser igualmente feliz nesse dia, mesmo que ela não esteja e sabe por que? Primeiro porque terei você, a Amy e nossa família, verdadeira família, essa que sei que me ama de verdade e que ama você."- lhe explicou, tratando de que Finn entendesse seu ponto. "Segundo porque nunca a tive. Não foi minha mãe, Finn. Nunca esteve quando eu a necessitei, nem nas boas e nem nas más. Não esteve na minha formatura, nem nas minhas noites de estreia, nem sequer veio me ver nos meus shows na Broadway. E mesmo que nesses momentos eu sentisse a sua falta quando não estava comigo, quando não conversávamos, quando não sabia nada de você... nunca pensei nela. Nunca senti falta dela. Isso é porque não... não a amo. Soa estúpido e até um pouco fora de lugar, mas é a verdade. Não posso amar uma pessoa que me fez sofrer dessa forma. Não a quero no meu casamento, não a quero em minha vida." – finalizou, deixando que um par de lágrimas fossem derramadas e tratando com toas as forças de não olhar para Finn.

Ele a trouxe para si, como fazia sempre e ela se sentou em seu colo, buscando conforto.

- "Eu sinto muito carinho. Eu só... queria ajudar." – se desculpou, enquanto acariciava o longo cabelo dela.

- "Eu sei. Deve deixar de me amar tanto, Finn." – respondeu ela, sorrindo.

Ele também sorriu.

- "Não acho que seja possível." – lhe disse, enquanto comia a metade do sanduíche de uma vez e lhe dava o resto.

-oo-

Finn e Rachel tinham que ter aprendido, a essas alturas, que as coisas não são fáceis (pelo menos para eles). Os casais normais seguem um ciclo comum: se conhecem, saem algumas vezes, se apaixonam, conhecem suas famílias, planejam se casar, vão morar juntos, fazem um lindo casamento, se mudam para a nova e própria casa. Tem um par de filhos e vivem juntos o resto de suas vidas (se não pertencem aos 50% dos casais que terminam se divorciando, mas eles assumem que nunca serão parte dessa estatística).

Não, eles fazem as coisas do jeito deles. Se apaixonaram há anos, quando nem sequer haviam se beijado propriamente, enquanto cantavam músicas do Journey e lutavam contra os raspadinhas no rosto. A primeira vez que ele disse para ela que a amava não estavam juntos e se separaram ao terminar o colégio porque se amavam demais.

Agora, depois de anos, iam se casar na cidade deles, no Natal, quando fazia pouco mais de um ano de seu reencontro. Haviam comprado uma casa depois de ter saído somente um par de meses. Falavam em ter filhos e de planos para o futuro com entusiasmo, quase com urgência.

Não encaixam em nenhum parâmetro e a maioria das vezes não se importam. Para dizer a verdade, Rachel se sente incrivelmente orgulhosa de que ela e Finn tenham um romance épico e diferente dos que as pessoas tem. Porém, Rachel se vê obrigada cedo ou tarde a entender que seus problemas são igualmente épicos e diferentes como o romance deles.

Esse dia, por exemplo, acordou pensando que talvez ela e Kurt poderiam ir ver alguns vestidos de noiva, plano que se evaporou quando Finn a recordou de que Quinn chegava essa mesma tarde para prepará-los para a audiência que teriam em uns dias para a guarda total de Amy.

- "Eu sinto muito. Tinha esquecido. Acho que... que quis apagar de alguma forma." – ela se desculpou, enquanto ele colocava o uniforme esportivo.

Finn se aproximou da cama, aonde Rachel ainda estava deitada e se sentou ao lado dela.

- "Não tenha medo, Rach. Não tem forma de que as coisas saiam mal." – murmurou, acariciando seu ainda sonolento rosto.

Era muito cedo para lidar com esse tipo de coisa.

Rachel arrumou a gola da camisa polo que ele vestia, deixando que suas mãos acariciassem ele na parte da nuca.

- "É possível que hoje eu te ame mais do que ontem? Porque ontem me parecia que não poderia te amar mais." – brincou ela, enquanto ele se recostava sobre seu peito, deixando que ela o abrace.

- "Sabe de uma coisa? Não somente é possível como que é altamente provável que amanhã me ame ainda mais. Pelo menos é o que eu aprendi." – ele explicou, seriamente.

Rachel sorriu ainda mais.

- "Ah sim? E... como aprendeu?"

- "Está fazendo tudo isso para que eu te diga que te amo quando não é necessário. Eu te amo, já sabe. Te amo as vinte e quatro horas do dia. Te amo agora mesmo." – murmurou Finn, se virando em seus braços para beijá-la. Sentiu como o riso abafado de Rachel rebatia em seu próprio peito e ele também sorriu. "Não está me levando a sério, Berry!"

- "Não posso levar a sério quando acaba se deitar sobre o prato de torradas que você mesmo preparou." – respondeu Rachel, com uma gargalhada, enquanto Finn saia ofendido para trocar o uniforme, agora sujo.

O resto do dia Rachel se encarregou de fazer anotações mentais de tudo o que pretendia dizer na audiência e pensou que fazer uso de seus dons artísticos não ia estar tão ruim (teoria que Kurt apoiou fervorosamente).

- "Amy, pode se apressar? Quinn chega no aeroporto em uma hora e devemos pegá-la a tempo." – gritou Rachel da cozinha, enquanto buscava sua bolsa e as chaves do carro.

- "Já vou mamãe." – respondeu a menina do andar de cima.

Estava terminando de pentear o cabelo no banheiro, quando escutou o interfone e a voz de Amy atendendo o intercomunicador. Segundos depois se deparou com uma estranha mulher sentada na cozinha.

- "Oi. Você deve ser a Rachel. Eu sou a Lindsay." – lhe disse, estendendo uma ossuda mão.

Rachel ficou embasbacada e por um segundo viu como Lindsay franzia a testa em sinal de reprovação diante a falta de cordialidade. Isso foi o que bastou para tirá-la de seu assombro.

- "Sim, Lindsay! Um prazer te conhecer. Não... não te esperávamos. Quer uma xícara de chá, um café?" – respondeu rapidamente, lhe devolvendo o aperto, o mais forte que pode.

- "Não, obrigada. Queria saber se poderia levar a Amy pelo resto da tarde." – contestou a mulher em tom frio.

Rachel se sentiu realmente intimidada: Lindsay era quase uma cabeça de diferença e vestia toda de preto, como estava se parecia com aquelas velhas governantas de colégios internos.

- "Bom... tínhamos planejado um par de coisas, mas não vejo... não vejo porque não podem passar a tarde juntas. Quer ir com a tia Lindsay, carinho?" – disse, olhando para Amy.

Ela encolheu os ombros, mas Rachel pode notar que a menina também se sentia intimidada.

- "Só... pegue a sua jaqueta, porque parece que vai chover e volte antes do jantar. Está bem?" – disse para Amy quando chegaram na porta para se despedir.

Lindsay já estava esperando dentro do carro e a menina se agarrou tão forte aos braços de Rachel que ela pensou que não poderia vê-la partir se continuassem ali um segundo mais. Viu como Amy se virava no carro e a cumprimentava tristemente com a mão, enquanto ela subia na caminhonete e iniciava seu caminho para o aeroporto.

-oo-

- "Como pode deixar que fosse com ela, Rachel? No dia anterior a audiência!" – disse Finn, bravo, jogando os braços no ar.

Fazia duas horas que haviam chegado em casa. Ele e Quinn não paravam de repetir para ela o erro enorme que havia cometido.

- "Eu sinto muito. Quantas vezes mais devo dizer? Sinto muito! Apareceu do nada e não podia dizer que não!" – respondeu ela, a beira das lágrimas, ganhando um olhar de reprovação de seu futuro marido.

- "Rachel... ela pegou a Amy para que lavasse o cérebro dela. Entende? Entende isso?" – contestou Finn, subindo ainda mais o tom, se esquecendo totalmente das lágrimas que começavam a cair pelo rosto de Rachel.

- "O que pretendia que eu fizesse, Finn? Se dizia que não... ficávamos com um mal pretendente. É família dela, não vi nada de mal em que passassem a tarde juntas." – se explicou, pela centésima vez.

- "Por que não me consultou? Deveria ter me ligado para me pedir autorização." – soltou ele e imediatamente se deu conta do erro que havia cometido.

Rachel parou de chorar e se aproximou das escadas, parando no primeiro degrau.

- "Se supõe, Finn, que tudo isso é para conseguir que Amy seja definitivamente minha filha. O que devo fazer então, se não confia em mim? Te ligar cada vez que alguma coisa se apresente? 'Finn, posso amarrar os sapatos dela? Finn, podemos cantar Grease? Finn, acha que podemos ir dar uma volta no parque?'" – disse ela, sinceramente ofendida, antes de se virar para terminar de subir as escadas e se trancar em seu quarto.

- "Acho que deveria..." – começou Quinn.

- "Não. Primeiro temos que ver como solucionar isso." – a interrompeu Finn, buscando os papeis e se sentando no sofá para lê-los.

Quinn olhou com temor para a escadas pela qual Rachel havia ido, antes de se sentar ao lado dele, para explicar as coisas, em detalhes, no que consistia a audiência.

-oo-

- "Como foi pequena? Se divertiu?" – disse Finn quando abriu a porta para receber Amy.

- "Fomos ao zoológico. Mas não tem mais esses pandas que vimos há um tempo com a mamãe. Acho que já cresceram." – lhe explicou, enquanto lhe dava o casaco.

Lindsay entrou atrás de Amy, dando um olhar de desprezo para Finn.

- "Há possibilidade de que tenhamos uma conversa?" – questionou, tirando também seu casaco.

Finn assentiu, ordenando que Amy posse para seu quarto e indo para a cozinha. Ainda quando esse lugar fosse o mais acolhedor da casa, somente a presença de Lindsay o fazia parecer mais frio.

- "Estive tratando toda a tarde de buscar uma forma de... esquivar a audiência de amanhã." – lhe explicou ela, tirando o as luvas e se sentando na mesa enquanto Finn preparava o café.

- "Se mal não recordo, foi você que pediu a audiência, Lindsay." – respondeu ele, tratando de entender aonde ela queria chegar.

- "Meu advogado me explicou que minhas chances do obter a guarda são... mínimas. Foram claramente ameaçadas pelos sucessos que vem tendo no último ano ao redor de Amy e quero que entenda que o que acontecerá amanhã significará para mim a última opção..."

- "Não, não é assim Lindsay. Não entendo porque está fazendo isso, porque expõe Amy a todo esse processo, quando nunca te neguei a oportunidade de ver ela." – a interrompeu Finn, enquanto se sentava ao lado dela e lhe entregava a xícara de café.

Lindsay não contestou imediatamente, mas tomou vários goles da bebida, antes de continuar.

- "Sabe o que vi essa tarde, Finn? Vi uma Amy totalmente diferente. Vi como essa mulher que ela chama de mãe está influenciando na menina. A forma em que fala, em que ri, em que...caminha. Tudo mudou. O lugar quase inexistente que eu ocupava na sua vida (ou que acreditava ocupar) foi preenchido por essa tal Rachel Berry. Essa que vai se casar com você, essa que ensina ela a cantar e a leva para ver as obras da Broadway. O que é isso Finn? Que vida está dando a sua filha? Uma vida em que ela aprende que a fama e a riqueza são tudo, que a beleza é o mais importante, fazer o que for para conseguir o que quer. Deixando ela com estrelas da Broadway e com... o estranho do seu irmão." – lhe disse, com a voz carregada de ira, mas mantendo o mesmo tom.

Finn conhecia muito bem esse tom, o tom com que os ignorantes costumavam falar de Kurt e soube que aquilo havia sido a gota que transbordava o copo: não deixaria que Lindsay se metesse com seu irmão e muito menos com Rachel.

- "Durante anos te deixei entrar em minha casa. Te senti como parte de minha família, abri as portas da minha vida e da de minha hoje, Lindsay... chegamos ao um ponto de rompimento. Não posso permitir que venha até meu lar e me falar que Rachel é um mal exemplo para minha filha, para nossa filha, porque não é. Rachel é o melhor que nos aconteceu em todos esses anos e sob nenhum conceito vou permitir que a insulte." – Finn disse, tratando de manter o tom civilizado, mas olhando diretamente nos olhos dela, cravando seu olhar assassino. "Rachel é nossa família. É a mãe dela, Lindsay, mãe dela. Amy sentiu isso ainda antes de eu a pedir em casamento e te desafio a ir até ela e lhe dizer que não pode ver a Rachel mais. Te desafio que olhe nos olhos dela e diga que ela e Rachel não podem se ver ou que seu tio não é um bom exemplo." – finalizou.

Lindsay manteve por um segundo o olhar frio, antes de voltar a se concentrar no fundo de sua xícara de café.

- "Claramente não tem sentido que conversemos sobre isso." – murmurou, pegando suas coisas para ir.

- "Posso dizer algo?" – disse a voz de Rachel desde a escura sala.

Finn viu ela entrar na cozinha, com os olhos inchados de tanto chorar e o cabelo um pouco bagunçado, mas cheia de uma determinação que ele conhecia muito bem.

- "Finn me escolheu como sua esposa e Amy me escolheu como sua mãe. Pode ser, que em algum ponto, eu esteja preenchendo o vazio que deixou sua irmã... mas não estou preenchendo o seu. Seu lugar, Lindsay, como tia da Amy está disponível sempre que quiser usá-lo. Ninguém vai tirá-lo jamais." – lhe explicou, segurando tentativamente a mão dela.

A mulher se moveu incomoda, se soltando dissimuladamente. Porém, quando levantou o olhar, Rachel pode notar uma certa faísca de agradecimento em seu olhar.

- "Eu só... ela é tudo o que me falta. É toda a família que tenho, não posso me dar o luxo de perdê-la. Nunca... nunca desejou que algo funcionasse tanto que perde... a noção das coisas e do tempo?" – lhe disse, quase em um sussurro.

Rachel olhou para Finn por um segundo.

- "Sim." – lhe respondeu simplesmente, olhando nos olhos dela com toda a sinceridade do mundo.

Lindsay colocou as luvas, enquanto se dirigia a porta.

- "Diga a Amy que amanhã de tarde eu passarei para buscá-la para fazer algo." – foi o único que disse, antes de deixar Rachel e Finn sozinhos na penumbra.

- "Isso significa... que não tem audiência, que conseguiu convencê-la?" – inquiriu Rachel, entusiasmada, se aproximando dele.

- "Acho que foi você a que convenceu ela." – murmurou Finn, a abraçando pela cintura e sorrindo tristemente. "Eu sinto muito, carinho. Não devia gritar com você mais cedo... estava muito nervoso."

- "Eu sei. Eu não devia ficar tão susceptível. Mas... valeu a pena, né?" – perguntou, abraçando ele pelo pescoço, fazendo com que suas testas se chocassem.

- "Sim. Valeu a pena." – respondeu Finn, beijando ela com todo o amor e a paixão que era possível.

Mais tarde, depois de que Quinn fez Rachel assinar os documentos de adoção e todos, inclusive Kurt e Blaine, se juntaram para jantar e celebrar, Rachel esperou que Finn entrasse no banho para buscar a pequena agenda rosa que guardava há anos. Caminhou muito devagar até a sala, tratando de não fazer barulho e discou para o número telefônico na escuridão. Sentiu uma onda de determinação ao escutar a familiar voz, anunciando a caixa postal.

- "Oi, Shelby. Sou Rachel... Rachel Berry. Não sei… não sei se lembra de mim. Enfim, vou me casar em uns meses e... bom, aconteceu algo hoje que me fez dar conta de que talvez deveríamos nos ver. Já sabe... faz tempo que não fazemos isso e acho que eu gostaria de ter contato com você. Espero que esteja bem. Esse é meu número e se quiser... me liga, ok? Só... adeus!" – disse, desligando o telefone e voltando para o quarto para entrar na cama, antes que Finn saísse do banho.

Sentiu como o quarto se inundava com o cheiro de sabão e creme para barbear quando ele terminou e se deslizou para seu lado na cama, enquanto apagava as luzes.

- "Rach?" – murmurou, enquanto a abraçava pela cintura e enterrava seu rosto no longo cabelo dela.

- "Sim?" – perguntou, fingindo uma voz cansada e se movendo na cama para se aproximar mais dele.

- "Me alegro que tenha me feito caso." – respondeu Finn, beijando ela na testa e desejando boa noite.

Rachel pensou que, talvez, não era tão ruim se encontrar com Shelby depois de tudo. Se as coisas saíssem mal, dessa vez ela teria o Finn.

Capítulo 20

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