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- "Rachel, saímos em dez minutos. Já ordenei o Alfred para corrigir o refletor esquerdo."

- "Obrigada Adam!" – respondeu das profundezas de seu camarim. Quantas vezes já fez isso? Havia perdido a conta há um tempo. Tomou o último gole daquele chá especificamente preparado para ela e se olhou no espelho. A maquiagem verde lhe cobria cada centímetro de seu rosto (tanto que as vezes lhe custava encontrar a si mesma entre toda aquela parafernália).

Alguém bateu suavemente na porta e ao abri-la se deparou com uma garotinha de não mais de 16 anos.

- "Posso te ajudar em algo?" – inquiriu com voz suave, reconhecendo o olhar em seu rosto ao instante: medo, admiração... e um pouco de amor também.

- "Sou Inês... a irmã de Glória, a figurinista e queria... queria te conhecer Senhorita Berry." – disse tremendo, em um sussurro quase inaudível. Rachel fez um gesto com a mão convidando ela para entrar.

- "Glória comentou comigo que você tem talento, que gosta de cantar." – Inês concordou, ainda no mesmo estado de choque. Rachel sorriu outra vez, tratando de amenizar a situação. "Você estuda Inês? Está se preparando? Porque deve saber... que nesse meio, ninguém vai te arrumar nada." – explicou.

- "Quero fazer isso desde que me entendo por gente, Senhorita Berry. Vou fazer o impossível para conseguir." – respondeu a menina. Rachel não pode evitar soltar um sorriso. Aquela determinação, aquele fogo nos olhos, aquele resplendor em seu rosto como se seus próprios sonhos escapassem pelos poros. Inês se parecia (talvez até demais) com a Rachel Berry que ela costumava ser.

- "Vejo muito de mim em você. Eu era exatamente igual a você. E... aqui estou né?" – dessa vez foi Inês a que soltou um risinho e seu rosto se tornou mais dócil.

- "É difícil?" – murmurou, olhando para Rachel diretamente nos olhos. Ela concordou, se aproximando de onde se encontrava a menina e a abraçando pelos ombros.

- "Requer tempo, esforço e muitos, mas muitos sacrifícios. Mas então..." – o som dos aplausos provenientes do andar inferior entrou pelas paredes e Rachel pode sentir como Inês tinha um calafrio.

- "Então isso acontece." – disse a menina. Se viram interrompidas por Adam, que entrou no quarto em busca de Rachel.

- "Quebre a perna!" – gritou Inês antes de ser arrastada pelo assistente que empurrava Rachel até o palco. Essa parou em seco: não havia escutado essa frase em vários anos. Sim, geralmente a desejavam, mas escutá-la de Inês era... como escutá-la de sua própria boca. Quando retomou a consciência já se encontrava em frente a centenas de entusiasmados rostos, recitando suas falas.

- "Excelente Rachel, hoje esteve maravilhosa!" – murmurou o diretor sorrindo. El apenas contestou com um piscar de olhos, se preparando para o cumprimento final.

'Quebre a perna', isso era tudo o que soava na mente há quase duas horas. 'Quebre a perna'. Aquela vida, essa que a pouco recordava, lhe parecia estar a anos luz. O nervosismo, as ânsias, os ensaios, o temor de ver tudo o que amava convertido em pedaços... essas coisas não acontecia com a nova Rachel. A nova Rachel era a estrela indiscutível do musical Wicked. Na Broadway. E porém... aquelas três palavras haviam bastado para iniciar essa sensação de vazio em seu interior que não podia apagar nem com a multidão que agora lhe aplaudia de pé. Não havia sido ela mesma a que havia desejado ao pouco coordenado Finn Hudson, uns dez anos atrás que quebrasse a perna? Sorriu ao pensar que Finn, provavelmente, não havia entendido nesse momento o que havia querido dizer. Pensando melhor, talvez nem sequer havia escutado ela.

Seguramente havia estado muito concentrado em lhe dizer... em lhe dizer que a amava. Se corou ao recordar, ao recordar aquela tom nervoso em seus olhos, ou o sorriso meio de lado que lhe deu depois. Se corou ainda mais ao pensar naquela música, nos primeiros acordes, no rio de adrenalina que lhe produzia cantar com ele e sentiu seu peito se inflar de orgulho: ainda então, todos esses anos depois, nada ia fazer ela tão orgulhosa como aquela versão de Faithfully que apresentaram nas Regionais de 2010. Tratou de se concentrar no momento, nos rostos que a olhavam embelezados, no som da multidão a aplaudindo. Tratou de tirar o rosto juvenil de Finn da mente, posto que tanto pensava nele que o gigante da terceira fileira começava a se parecer com ele. Viu a cortina se fechar e o som dos aplausos se apaziguar.

- "Saímos para tomar algo?" – perguntou Garret, seu co-protagonista, se desfazendo do disfarce.

- "Acho que essa noite não. Não se ofenda, mas foi um dia carregado." – lhe respondeu, tirando ela também o vestido quando entrou no camarim.

- "Não acha que devemos tomar um pouco antes de te ver nua?" – inquiriu uma voz extremamente familiar. Rachel se sobressaltou ao se deparar com o sorridente rosto de Kurt Hummel refletido no espelho.

- "O que faz aqui? Como entrou?" – lhe perguntou, o abraçando tão forte como lhe foi possível. Kurt lhe devolveu o abraço, a levantando uns centímetros do chão.

- "Aparentemente sou um renomado desenhista de cenários. Isso me dá livre acesso a esse teatro." – lhe explicou, ainda sem soltá-la. Desgrudou um pouco para olhá-la nos olhos. "Veja você, Berry. Você conseguiu!" – murmurou.

- "Conseguimos!" – respondeu ela. Se olharam um segundo em silencio, trocando olhares de orgulho e ambos se soltaram antes de derramar algumas lágrimas. "Não há uma só noite que não pense em você ao cantar Defying Gravity."

- "Imaginei! É difícil me esquecer." – respondeu Kurt, entrando no closet de Rachel enquanto o assistente dela lhe tirava a maquiagem. "Então..." – disse dando uma virada tão exagerada que Rachel não pode evitar sorrir. "...realmente está cansada, ou só queria tirar o Garret de cima?"

- "Nunca estou muito cansada para você, se é isso que refere."

- "Bem... te esperamos lá fora e vamos jantar algo." – com isso se retirou do quarto antes que Rachel pudesse lhe perguntar exatamente quem integrava a comitiva.

Vinte minutos mais tarde Rachel entrava nas profundezas de fãs tratando de autografar a maior quantidade de cartazes e soundtracks possíveis, quando avistou Kurt recostado em um carro vermelho a poucos metros de distância.

- "Esse é o último?" – perguntou pegando com cuidado uma pequena capa plástico do cd.

- "Sim, esse é. É para Amy." – respondeu o dono. Rachel deu o autógrafo rapidamente, lhe devolvendo para o dono. "Senhorita Berry! Senhorita Berry!" – ele gritou.

- "Escrevi errado o nome?"

- "Não... me perguntava porque ainda coloca estrelas no final do seu nome. Digo... não necessita as metáforas. Já se converteu em uma." – só então Rachel se virou para olhá-lo. Ali estava, em carne e osso, o terrivelmente descoordenado Finn Hudson. Se tivesse podido tirar os olhos de coma dele, teria visualizado Kurt e Blaine trocando olhares de triunfo.

Capítulo 1

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